E forças invisíveis padronizavam tendências absolutistas entre um sim um não e dois talvez, fiquei pasmo boquiaberto silenciado ouvindo as palavras dela que pareciam terem o efeito de detergente pra minha mente; 10,20,30, uma hora e mais, sob nádegas da minha memória mergulhei e as lembranças vinham de graça” Meu Pai, Mãe, Irmãos, Mulher, filhos etc.” o coração batia igual a instrumentais musicais, o estômago dobrava-se igual ao estado da minha alma (de Joelho).
Levantei a cabeça, com a mão esquerda endireitei as sobrancelhas, coloquei as mãos sob as costas, Era a minha vez de falar, tenho que estar concentrado e mais lúcido possível, era uma tarefa que tornara-se mais difícil em função aos dias antecedidos.
-Eu sou o Enoch Bernardo Livulo Sapalo
-Fale mais alto não consigo ouvi-lo, alguém interrompeu.
Engoli uma quantidade de minhas próprias salivas como se fosse sumo, peguei o balanço psicológico, oxigenei as janelas da minha inteligência e vi ela a encolher-se na sua própria cadeira, ocupou o vazia do universo, ela disparava-me com os seus olhos, e os meus pensamentos tornaram-se mais coloridos, reuni respostas básicas identificadas com s meus sentimentos e o meu estado de espírito e comecei.
Era uma escuridão de cegar os olhos.
-Como é bradas?
-Ya tudo fixe.
Eram muitas vozes para corpos que meus olhos não viam, não sabia onde me dirigir, procurei um cantinho por baixo e me sentei, o cheiro era horripilante meu coração batia 3 à 4 vezes mais rápido ou mais lento que o normal, não consigo descrever ao certo aqueles instantes; passaram minutos e os olhos começavam a adaptar-se ao escuro, vi baratas, vi cobertores, vi papelões, vi copos e pratos mergulhados em baratas etc. ~
-Madié, você é quali tó babulo?
Fiquei perdido, asfixiado de tristeza e respondi: Mota, andei sem capacete. Parei por ali e não queria entrar nos detalhes mais profundos, estive física e psicologicamente cansado, com o estômago vazio, cabeça a doer trancado sob quatro paredes no escuro, queria ter sono e ao mesmo tempo evitava o mesmo.
Passavam horas e horas e horas e a cada segundo ou minuto eu revia e revivia o vídeo da minha memória do motivo pelo qual eu era condenado; e estava cada vez mais difícil de perceber, sentia-me com a cabeça perdida no ar que respirava e nos sons que tropeçavam meus ouvidos, eram vozes de colegas de cela, que se expressavam na língua pura do povo namibense (mucubal)
Horas passavam e cada vez mais era governado pela aflição de querer sair, era como que se estivesse sob um balão de oxigénio emprestado e que esgotava-se a cada instante, estava ficando sem Ar, a cabeça não parava de doer, o estômago ruía cada vez mais, em frente de mim dois mucubais que deitavam-se ao solo fedorento, infectado de baratas e urinas, do outro lado o chefe de cela, um jovem de pele muito escura, lábios mais negros ainda, estava de calção-bermuda e um casaco, seu vocabulário era todo ele governado de calão, do lado dele o fedor de pomada leopardo era intenso e de seguida consegui notar que o Leão da cela estava ferido no joelho e uma daquelas bem profunda; mas ainda assim eram inferiores em relação as feridas que se estavam escavando dentro de mim.
O chefe tentava distrair-me com suas conversas e conseguiu por alguns minutinhos, mas não tinha jeito, eu estava pedido sob quatro paredes e com um ar pecaminoso; sem saber se era dia ou noite, ou ao menos que horas eram, quando de repente ouvi passos se aproximando e depois chaves manipulando os portões.
-Quem é o Enock?
-Sou eu.
-Toma isso.
Era um saco preto com loiças por cima, enquanto ia transferindo as tigelas o segurança disse:
… Eh éh éh esse garfo tira dai, essa tigela térmica não vai entrar, arranja outra tigela, então muito rapidamente pedi a tigela plástica do chefe de cela, em função da presença intimidadora do policial, rapidamente segurei na mesma tigela, suja como estava segurei a comida toda com as mãos e transferi-a; minha cabeça estoirava com a humilhação excessiva, eu esperava que lá fora meus familiares estivessem fazendo manobras para a minha retirada em liberdade. Após colocar a tigela no lugar, o segurança policial em tom de determinação e arrogância disse: pronto, agora deixa isso ai e vem aqui, me acompanha.
Eu acredito que um dia posso voar, na vida cada um de nós acredita no aparecer de dias melhores, se antes minha alegria jogava anão e gigante, a partir daquelas horas alegria jogou simplesmente anão e estava sem forças para se pôr em pé, os músculos estalavam e a bunda abanava só de medo; eram chegados meus dias de crueldade, isolamento desespero, dúvida, reflexão, etc. Etc.
Ela era de pele mais clara, meio mulata, meiga , estava sentada de vestes preta e eu na cadeira de réu; ela era a procuradora que tinha sob tutela em primeira mão o meu caso, Era 10 de Janeiro , sábado 9 horas como pude ver no relógio do pulso do policial que abriu a cela, finalmente estava na auscultação, após uma noite terrível sem sono, com baratas a invadirem as cobertas, suportar o rumor dos peidos e fedor das fezes que são feitas em sacos e depositadas em baldes, só não vomitei porque não tinha comido nada desde a minha detenção, meu cérebro parecia um palco de terror de uma sessão cinematográfica sem câmaras nenhuma, A procuradora interrogou-me , dei as respostas, falei somente a verdade e de seguida ela pronunciou-se:
-Bem, você é professor, e eu gostava de te libertar agora mas a maneira com o teu processo está não posso fazer nada, se eu arriscar ficarei eu em maus lençóis. Assinou e de seguida fui conduzido como detido ao complexo presidiário Comarca.
O cheiro era estranho nem muito mau, mas distante de ser agradável, fui rezando para que caísse em boas mãos e em boa cela, e as orações tiveram efeito, fiquei na cela de um dos chefes da prisão partilhando o mesmo corredor com um mecânico profissional (Acusado de Burla) um Capitão das forças armadas de Angola (Acusado de violação) e Eu (Condução ilegal - sem capacete e resistência) os dias foram passando vi homens masturbando-se para compensar a tristeza, vi delinquentes e marginais lendo a bíblia, outros mais felizes outros mais tristes, alguns magros de primeira etc. vi pastores, professores, militares, bandidos de primeira etc. Mas as condições eram mais ou menos humanas, podíamos banhar, ver o sol e ver a televisão, mas por dentro a fúria ruía , falávamos de tudo pra ver o tempo passar, aprendi algumas coisas e desaprendi outras.
Quarto dia de detido, quarta visita do dia Senhor Alexandre Vilengalenga, caro Advogado que negou ou duvidou da minha explicação do problema e ameaçou-me dizendo: tens que ter em conta para além de Deus , a única pessoa que tens que falar a verdade sou Eu, e eu insisti e disse que era só isso e não tinha mesmo porquê mentir.
-Possas! Esses homens também são demais, mas então você não atropelou ninguém, só resististe porque paraste mas em casa a frente, não bateste não lutaste e ao preencher deste os teus dados local de trabalho e você como professor não tens porque estar aqui, ate porque você não corre risco de fuga.
Eram as palavras do advogado a que meus ouvidos engoliam mansamente, assim como minha mente também.
E assim dias se foram ate que finalmente sai em liberdade com mais peso em relação a quando da minha entrada e com a pele mais clara também.
Que fique bem claro, as vezes ignorar , desculpar-se é sempre melhor.
Com partículas de ódios privados fui detido e entretanto as coisas se foram e lá se foi uma lição de vida
Por: Enoch Livulo
2703015